Adaptação Climática na Indústria: Caminhos para a Resiliência e Financiamento da Transição
- Luciana Novais Lanna e Paula Meireles Aguiar
- 24 de nov.
- 4 min de leitura
Por Paula Meireles e Luciana Lanna, associadas fundadoras do IBRAAC – Instituto Brasileiro de Adaptação Climática.

1. O novo paradigma da adaptação empresarial
A intensificação de eventos climáticos extremos, como inundações, secas e ondas de calor, já representa um desafio concreto para o setor industrial.[1] No Brasil, entre 2013 e 2023, os desastres naturais causaram perdas econômicas superiores a R$ 732 bilhões nas cidades do país.[2] Esse cenário evidencia que a adaptação não é apenas uma pauta ambiental, mas uma questão de gestão estratégica e continuidade operacional.
A indústria, fortemente dependente de infraestrutura física e de cadeias produtivas complexas, precisa incorporar a variável climática em seus modelos de negócio. O setor privado tem papel central na mobilização de recursos, na inovação tecnológica e na implementação de soluções que fortaleçam a resiliência de suas operações e dos territórios onde atuam.
2. Frameworks e diretrizes para a adaptação corporativa
A consolidação de normas e frameworks internacionais tem contribuído para orientar e padronizar o relato e a implementação de estratégias empresariais de adaptação. Entre os principais instrumentos destacam-se:
IFRS S2 (Sustainability Disclosure Standards) – estabelece parâmetros para divulgação de riscos e oportunidades relacionados ao clima, incluindo adaptação e resiliência corporativa;[3]
GRI (Global Reporting Initiative) – indicadores específicos sobre riscos físicos, de transição e de adaptação;[4]
CDP (Carbon Disclosure Project) – inclui módulos de relato sobre riscos climáticos e gestão da adaptação;[5]
ISO 14090 e 14091 – normas internacionais voltadas para o planejamento, implementação e avaliação da adaptação às mudanças climáticas.[6]
No contexto nacional, o Programa Brasileiro de Relato Empresarial em Adaptação Climática,[7] coordenado pelo FGVces, constitui uma iniciativa pioneira para apoiar empresas na identificação de riscos climáticos, no relato transparente de medidas adaptativas e na integração da adaptação à governança corporativa. Além disso, instrumentos regulatórios recentes — como a Resolução CVM nº 193/2023[8] e a Taxonomia Sustentável Brasileira — reforçam o alinhamento entre o setor privado e as políticas públicas de adaptação.
Esses frameworks incentivam uma abordagem que combina infraestrutura cinza, verde e azul, governança multissetorial e justiça climática, ampliando o impacto das estratégias empresariais sobre comunidades e ecossistemas.
3. Medidas de adaptação para o setor industrial
A adaptação industrial requer ações articuladas entre planejamento estratégico, inovação e gestão de riscos. As medidas mais relevantes incluem:
Avaliação de vulnerabilidades e riscos climáticos — análise de exposição física de ativos e cadeias de suprimento;[9]
Diversificação de insumos e rotas logísticas, reduzindo dependências críticas;
Infraestrutura resiliente — adaptação de plantas industriais, drenagem e sistemas de energia;
Gestão hídrica e eficiência energética, integrando soluções baseadas na natureza;
Digitalização e monitoramento climático, com uso de dados e modelagem para prever impactos;
Engajamento comunitário e territorial, fortalecendo a capacidade adaptativa das populações locais.
Essas medidas, além de reduzirem riscos operacionais, geram vantagem competitiva e atraem investidores preocupados com a sustentabilidade de longo prazo.
4. Financiamento e mecanismos econômicos para a adaptação
A implementação de estratégias de adaptação exige novas fontes e instrumentos de financiamento. Embora os fluxos globais destinados à adaptação (US$ 63 bilhões anuais entre 2021 e 2022) ainda estejam aquém das necessidades, estimadas em US$ 212 bilhões/ano até 2030, segundo o UNEP[10], observa-se crescente engajamento de bancos de desenvolvimento e do setor privado.
No Brasil, destacam-se:
Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (Fundo Clima)[11], que recebeu recentemente aportes de R$ 10,6 bilhões de bancos europeus (KfW, AFD e CDP) e do BID, com foco em projetos de resiliência e baixo carbono;
Mecanismos de blended finance, que combinam capital público e privado para mitigar riscos de investimento e atrair financiamento para projetos de adaptação;
Green Bonds e Sustainability-Linked Loans, com métricas de desempenho atreladas à redução de vulnerabilidades climáticas;
Programas de capacitação, como o Sistema Adapta Brasil[12] e as parcerias CNI–MCTI, que apoiam o setor industrial na elaboração de planos de adaptação e gestão de riscos climáticos.
Essas iniciativas reforçam o entendimento de que adaptação é também uma oportunidade econômica, capaz de estimular novos negócios, empregos verdes e inovação tecnológica.
5. Caminhos para a ação
A agenda de adaptação industrial demanda integração entre políticas públicas, governança corporativa e instrumentos financeiros. As empresas que incorporarem a adaptação de forma estratégica, reportando riscos, implementando medidas efetivas e acessando financiamentos climáticos, estarão mais bem posicionadas para enfrentar o novo contexto climático e regulatório.
A transição para uma economia resiliente depende, portanto, de uma aliança entre competitividade e sustentabilidade, na qual a adaptação se torne parte essencial da gestão empresarial e da responsabilidade socioambiental corporativa.
Referências:UNEP (2024); CPI (2023); CNN Brasil (2025); FGVces (2024); IPCC (2021); CNM (2024); CVM (2023); MCTI (Sistema Adapta Brasil); Fundo Clima; A Economia B (2024).
[1] IPCC (2021). – Acesso em: https://www.ipcc.ch
[2] CNN Brasil (2025) – Acesso em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/analise-desastres-custaram-r-732-bi-aos-municipios/#goog_rewarded
[3] IFRS S2 – ISSB (2023). – Acesso em: https://www.ifrs.org
[4] Global Reporting Initiative (GRI). – Acesso em: https://www.globalreporting.org
[5] Carbon Disclosure Project (CDP). – Acesso em: https://www.cdp.net
[6] ISO 14090 e ISO 14091. – Acesso em: https://www.iso.org
[7] FGVces (2024). – Acesso em: https://centrodeestudos.fgv.br
[8] CVM Resolução nº 193 (2023). – Acesso em: https://www.gov.br/cvm
[9] A Economia B (2024). – Acesso em: https://aeconomiab.com
[10] UNEP Adaptation Gap Report (2024). – Acesso em: https://www.unep.org
[11] Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (2024). – Acesso em: https://www.gov.br/mma
[12] MCTI – Sistema Adapta Brasil. – Acesso em: https://adaptabrasil.mcti.gov.br

